O rosto de Maria Mutola aparece em cartazes e muros de seu país natal, Moçambique, como um raio de esperança em uma nação conhecida no mundo inteiro por guerras, enchentes e fome.
Figura dominante nos 800 metros femininos durante uma década, Mutola tornou-se a primeira atleta a ganhar a bolada de US$ 1 milhão da Golden League no ano passado. A renda per capita de seu país, de 18 milhões de habitantes, está bem abaixo dos US$ 300 por ano.
Mutola, que defenderá seu título olímpico em Atenas em agosto, é idolatrada em casa porque investe grande parte de sua riqueza em uma fundação para ajudar na formação de atletas e na luta contra a pobreza.
Mutola é a pessoa mais conhecida em Moçambique depois do presidente Joaquim Chissano. Conhecida como "Expresso de Maputo", Mutola conquistou o sexto título indoor, com direito a quebra de recorde, em Budapeste no início deste mês.
"Ela é uma inspiração para este país. Centenas de crianças olham e dizem: ei, queremos ser como Maria, campeã mundial", disse o presidente Chissano. "Sempre aparece alguma pessoa que influencia as vidas de outras, e Mutola vem sendo uma influência positiva em Moçambique nas últimas duas décadas".
Apoio
A empresa de telefones celulares de Moçambique mCel, um dos patrocinadores de Mutola desde 2001, renovou recentemente seu contrato com a atleta até 2007. "O contrato entre Mutola e a mCel não é somente comercial, já que Mutola decidiu enviar os dividendos deste contrato para sua fundação", disse a mCel.
A Fundação Lurdes Mutola - Lurdes é o segundo nome de Maria - identifica jovens talentos e organiza seus treinamentos em Moçambique e no exterior.
Também há programas de educação e alimentação para os atletas selecionados, por causa da grave pobreza que algumas famílias enfrentam, disse Bruno Macamo, presidente da fundação.
Dois terços da população de Moçambique vive abaixo da linha de pobreza do Banco Mundial, de 1 dólar por dia, e a ONU classifica o país, que sofreu com 16 anos de guerra civil, como um dos 10 mais pobres do mundo.
"Já estamos ajudando alguns atletas a estudar e treinar no exterior", disse Macamo, citando Elisa Cossa, do salto em distância, que recebe uma bolsa de estudos em Portugal, e a velocista Carina Pinto, que compartilha o apartamento que Mutola ocupou durante muitos anos em Oregon, nos EUA.
Mutola também fornece casa para sua prima Catarina, que perdeu a mãe há 13 anos, vítima de malária.
Recorde
Aos 31 anos de idade, Mutola disse que deseja embolsar outro ouro em Atenas e depois defender seu título mundial no próximo ano antes de deixar o esporte, enquanto ainda estiver no auge. "Acho que não poderei participar das Olimpíadas de 2008 na China", disse Mutola.
Se tiver uma temporada sem contusões, Mutola também quer tentar quebrar o recorde que já dura há 21 anos da tcheca Jarmila Kratochvilova nos 800 metros, de 1min53s28. "Tentei muito quebrar este recorde. Ainda é um dos meus sonhos", disse Mutola, que tem o melhor tempo de 1m55s19, estabelecido há dez anos.
Mutola divide seu tempo principalmente entre os EUA e Johanesburgo, que afirma ser o lugar mais próximo de sua pátria que oferece treinamento em alta altitude.
Quando está em Moçambique, ela mora em uma mansão que ganhou do governo no badalado subúrbio de Triunfo, à beira da praia, em reconhecimento ao seu sucesso.
Mutola começou a carreira no esporte como jogadora de futebol antes de ser levada, aos 14 anos, pelo conhecido poeta moçambicano e técnico de atletismo Jose Craverinha, que a viu jogando nas ruas de Maputo.
"Mutola é parte das boas notícias de Moçambique e uma lembrança do espírito de luta de Moçambique. Terminamos a guerra civil e agora vivemos em paz e superamos adversidades naturais como enchentes e ciclones", disse Chissano.